terça-feira, setembro 20, 2005

Momentos Poéticos III



Tira-me o pão, se quiseres,

tira-me o ar, mas não

me tires o teu riso.





Não me tires a rosa,

a lança que desfolhas,

a água que de súbito

brota da tua alegria,

a repentina onda

de prata que em ti nasce.





A minha luta é dura e regresso

com os olhos cansados

às vezes por ver

que a terra não muda,

mas ao entrar teu riso

sobe ao céu a procurar-me

e abre-me todas

as portas da vida.





Meu amor, nos momentos

mais escuros solta

o teu riso e se de súbito

vires que o meu sangue mancha

as pedras da rua,

ri, porque o teu riso

será para as minhas mãos

como uma espada fresca.





À beira do mar, no outono,

teu riso deve erguer

sua cascata de espuma,

e na primavera, amor,

quero teu riso como

a flor que esperava,

a flor azul, a rosa

da minha pátria sonora.





Ri-te da noite,

do dia, da lua,

ri-te das ruas

tortas da ilha,

ri-te deste grosseiro

rapaz que te ama,

mas quando abro

os olhos e os fecho,

quando meus passos vão,

quando voltam meus passos,

nega-me o pão, o ar,

a luz, a primavera,

mas nunca o teu riso,

porque então morreria.





Pablo Neruda





***














Musica para a Poesia: For Your Love - Stevie Wonder

Sentimentos?


É normal acordarmos mais felizes ou mais tristes, mais sorridentes ou mais sisudos, com vontade de mandar flores ao mundo ou mandar o mesmo mundo se explodir, mas é normal quando isso se torna uma constante? Que sentimento é este que, mesmo vendo as adversidades e os problemas cotidianos, que normalmente esgotam seu limite da paciência e da ansiedade, continua a te fazer sorrir, cantar, acordar bem disposto para tarefas rotineiras e maçantes, como escrever uma monografia, por exemplo? Que estranha calma é essa que faz parecer seu mundo andar mais lentamente, ou ,pelo menos, ter a consciência de que você pode fazer tudo com menos ansiedade, com menos pressa? Que leveza é essa que acredito poder, mesmo com algumas dezenas de quilos a mais, voar e espairecer a mente? Que tranqüilidade é essa que me faz ter confiança daquilo que sempre duvidei em 21 anos e tomar como certeza da noite pro dia? Que felicidade instantânea, que diferente paz é essa que consegue paralisar um hiperativo como eu em pleno domingo e o deixa deitado na cama, reflexivo, pensando em tudo, em nada, ou só sentindo, deixando a melodia de Johnny Mathis te guiar para onde não sei?


Já disse uma vez não gosto de usar certos rótulos em vão. Apaixonado? Enamorado? Envolvido? Admirado? Não sei, talvez nada por enquanto, talvez tudo, só sei, e tenho aprendido a cada dia mais, que é um sentimento tão bom e tão saudável que não quero pensar no futuro, pois posso perder o melhor do presente. Uma sensação de vigor, de ser amado e amar. Oras, podemos desejar nosso sucesso profissional, e pessoas renunciam seus sentimentos em prol desse sucesso, mas não há algo melhor, mais edificante, do que a certeza de que pode fazer toda a diferença a alguém, pode fazer alguém amado se sentir bem, mas, sobretudo, o contrário: de ser sentir bem, se sentir amado, de perceber de que nenhuma ilha é uma ilha, por mais que busque.


As pessoas mais machucam do que edificam, porém, certos ‘alguém’ nos engrandecem sem perceber, de forma natural e espontânea, que só podem ser comparadas a anjos. Resta a mim e a todos apenas admirar, às vezes no silêncio, e torcer que esse anjo se humanize e veja a ti também como um anjo. Você já parou para pensar se você já bem fez a alguém hoje. Qualquer um: seu namorado, seus pais, seus amigos. Uma palavra amiga, um abraço, um beijo? Coisas fáceis, simples, e que a gente não dá muito valor? São exatamente essas as que mais me encantam.É exatamente isso que busco fazer, por mais falho que seja: que se sintam tão bem quanto eu me sinto por causa deles. Da mesma forma que posso ir ao céus com um elogio despretensioso, posso cair no vale da amargura e da tristeza com uma palavra despretensiosa também. As pessoas não querem ter mais controle sobre o que dizem, sobre o grande tesouro e a grande arma que ganharam geneticamente: o poder de usar as palavras.Por isso, são tão inocentes quanto culpadas quando elevam ou destroem alguém.


Mas o mundo pode cair, o Brasil se tornar uma ditadura comunista, o Flamengo descer à segunda divisão, que eu to aqui feliz e em paz. Não sei até quanto tempo, sentimentos são como nuvens: se dissolvem na mesma velocidade que aparecem e cobrindo a todos, nos envolvem numa atmosfera impossível de sair por recursos humanos. Mas o que vale é o agora, então sinta o presente: não sei até essa história vai embora alguns flashes resolvam, de quando em vez, passar pela minha mente, devaneios típicos de um ansioso em recuperação, contudo sei que me faz bem, muito bem. Gostaria de gritar ao mundo seu nome, mas o bom senso e a educação me aconselham a berrar internamente, sem orgulhos, sem medo nem ansiedades. Eu to me vendo diferente, mais leve, menos ansioso, mais...tantas coisas que acredito não ter palavras para descrever.


Afinal, o que é isso? O que eu tomei?







***





Musica do Post: Isn't it the Romantic- Johnny Mathis







quinta-feira, setembro 01, 2005

Mas eu me mordo de Ciumes...





“Por favor, não mande nenhum recadinho, nenhum scrap, nenhum depoimento no meu orkut, por favor! Por favor!”




Foi assim que uma aluna, em pranto convulsivo, reagia a minha descoberta de seu orkut. O motivo? O namorado sempre sente ciúmes, e isso ocasiona brigas que levam uma menina a chorar só ao lembrar que poderia haver outra.Sinceramente, aquilo me assustou e pensei em dizer algumas coisas, por vezes desconexas, sobre o ciúme.





Ciúme: alguns dizem que é totalmente ruim, outros, dizem que tem seus benefícios.Como tudo na vida, nada é tão mal ou tão bom, portanto, o seu equilíbrio é fundamental, e digamos, até saudável num relacionamento. O problema está quando este sentimento tão avassalador se transforma em obsessão: a cada dia mais, há um retorno, ou desvelamento, do sentimento de posse das pessoas para com quem elas dizem que ‘amam’, como se estas fossem coisas, completamente sem vida social, sem rede amigos. Casais de namorados são os mais atingidos por essa onda: é natural, e até compreensível, que haja uma espécie de autoproteção inicial: ficam mais pertos, não saem com tanta freqüência com os amigos, se devotam aos seus agora amados. Mas quando passa o tempo do deslumbre, continuar a esquecer os amigos porque o(a) namorado(a) assim exige,porque tem ciúmes, é ridículo. Ninguém é posse de ninguém, principalmente porque as pessoas tenderam, gradativamente, a esquecer a real intenção do namoro, que é o de se conhecerem, e não de agir como se fossem casados, e, no caso, mal-casados, e interferirem na vida outro e na sua vida social.






Isso nos leva a pensar em razões, dentre várias, do ciúme assombrar as nossas mentes (sim, a minha também é afetada, como veremos mais abaixo).A primeira é a insegurança:essa é clássica, todo mundo, nas rodas de conversa da vida, diz que é insegurança o principal motivo dos ciúmes. E quem sou eu para discordar? Concordo, pois as pessoas cada dia mais se sentem menos capacitadas a acreditar em si mesmas, nas suas qualidades, virtudes que possam levar o seu parceiro(a) a admira-lo a ponto de tê-lo como o amado, embora isso não exclua ao mesmo tempo, de ter amigos ao redor.E isso produz, imediatamente, um falta de confiança no outro. Já sei que uma das principais dificuldades da minha futura amada será o de entender o meu relacionamento com as minhas amigas, que são o grupo majoritário do meu ciclo de amizade. E, atrelado a insegurança em vertiginoso crescimento, há uma segunda razão, para mim, que também é o causador do ciúmes: ao caráter descartável dos relacionamentos, cada dia mais efêmeros, cada dia menos profundos, cada dia menos estáveis. A onda do ficar entrou e viciou, como um bom chocolate, as pessoas. Eu já fui mais radical quanto a isso, hoje em dia, entendo as vontades das pessoas sem julgá-las, contudo, por vezes há o exagero: hoje o n°1, amanhã o n° 2, no outro dia, o n°592, depois de volta ao n°1 e se acha feliz por isso. Isso gera dentro da pessoa a falta de uma estabilidade, e que, quando se namora, é um produtor de traições a torto e a direita. Que contradição: enquanto o ciúme aumenta, a descarte de relacionamentos também recrudesce. Não há profundidade porque não há confiança no outro. Mesmo que isso visto pelos outro como bom, não consigo me imaginar num relacionamento superficial: estando em um relacionamento, o que não é tão fácil assim, entro no meu submarino do amor, rumo ao mais profundo, ao mais denso, de preferência, sem previsão de volta. Apesar de doer deveras quando o comando aqui de cima manda o submarino emergir, é uma sensação indescritível, sensação de amar incondicionalmente, mesmo sem retorno, amar altruistamente.





Há outros tipos de ciúmes, fora do campo amoroso. O ciúme do amigo é algo tão presente quanto velado entre nós, talvez porque neste se revele a real insegurança que há em nós. Falo por mim agora: não tenho tanto ciúmes quando estou com a pessoa amada, mesmo porque sempre fica bem claro que, se ela está comigo, é por que alguma coisa eu posso doar, e quando não há mais amor, seja a definição desse termo tão polissêmico, fica claro que não tem mais porque continuar. Entretanto, com meus amigos, pode me chamar de Sr.Ciúmes: inseguro como eu sou, sempre acredito que fiz alguma coisa de errado para um amigo não puxar assunto, convidar para uma festa, ou mesmo me contar sobre uma nova amizade. Ah! As amizades deles, se eu pudesse, devoraria todos, e deixava só com um amigo: eu. Também é um misto com carência: pessoas que se isolam por outras questões que não a sua vontade, sentem necessidade do toque, mesmo que virtual: um telefonema, um cartão, um scrap, uma carta.(Tenho saudades das minhas cartas, gosto de enviar, mas isso fica para uma outra hora). Embora guardadas as devidas proporções, estou tão errado quanto o namorado da minha aluna, ao tentar, num esforço egocêntrico, ter a mim como o único amigo dos meus amigos. Cada dia mais estamos mais egoístas, mais voltado para as nossas necessidades, nossos desejos, nossas vontades, esquecendo dos outros. Tento, a cada dia, e com esmero não ser mais assim, e to melhorando, o que prova que há cura para o ciúme, mesmo embora sofra ainda com o desinteresse de amigos que tanto querem bem, que pareciam ser daqueles amigos, quase irmãos, e inexplicavelmente gelam o seu comportamento, causando profundos furos numa alma já insegura, que doem mais do que qualquer rompimento de relacionamento amoroso.






Mas um pouco de ciúme, beirando o ‘charminho’ é vital para um relacionamento: demonstra interesse, preocupação. Mas mesmo assim, tem que se tomar cuidado com as falsas generalizações: nem todo homem que é generoso, amigo, conselheiro, que dá presentes fora do período festivo é alguém que tenha algum interesse pessoal. Falo por mim, novamente:gosto de presentear, mandar cartões, telefonar não, sou muito tímido para isso e invento que não gosto de telefone, enviar músicas, scraps, sms, etc. E não vejo mal nisso, mesmo não faça muito isso com as amigas que namoram-casadas-noivas-ficantes-enroladas, pois declarações de amor não se resumem a eu te amo, e não se prendem a uma pessoa só, de outro sexo: amigos são amantes, eternos doadores e renunciadores de si em prol do outro.





Uma fala totalmente parcial: não percam sua individualidade por causa de outra pessoa, falo isso de experiência própria: amores passam, amizades permanecem, mas quando esquecidas tentar reconquista-las são tão difíceis. Olhe ao seu redor e veja se realmente ama parceiro(a) ou esta apenas acomodada a um relacionamento dito estável, seja pelo laço de tempo ou coisa parecida.Isso é a pior das coisas: a falta de amor. Isso tem conseqüência, que posso falar, traumáticas.






Amem, vivam, beijem, curtam, mas não se isolem, não prometam a mim, mas a vocês mesmos.







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Musica do Post: Trapped In the Closet - R. Kelly (Um suspense numa música em 5 partes, fenomenal)